segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Os processos de crescimento das grandes cidades do mundo

É curiosa a maneira como se dá o crescimento das grandes metrópoles do mundo. Por algum elemento pré-existente, pequenos agrupamentos humanos vão se estabelecendo e dessa forma se multiplicando, expandindo territorialmente e consolidando o que hoje conhecemos por cidades.
O processo pode acontecer por diferentes razões e formas, mas o fenômeno produzido por eles lhe impõem características antropológicas e físicas semelhantes: o surgimento de atividades de subsistência baseadas em determinados modos de produção, que posteriormente originará o que entendemos por economia; este fator regido por uma organização estabelecida em relações hierárquicas e de interdependência, que se define como política; a transformação em palco de manifestações de costumes e rituais entendidos como cultura; e por fim, determinado por estes fatores anteriormente citados, unidos às condições naturais do lócus se dará o que Robert Venturi definiria como Urban Sprawn ou espalhamento urbano.
Atentemo-nos para a analogia de algumas das grandes cidades do mundo na tentativa de entender as relações que estabeleceram suas atuais condições urbanísticas.
Iniciemos por Roma, berço da civilização ocidental, originada numa pequena concentração nas margens do Rio Tevere, que se expandiu conforme o passar do tempo. Conhecida como A Cidade Eterna, é testemunha de grandes acontecimentos da história e guarda em suas ruínas as evidências da existência de impérios extintos, mudança de poderes e crenças. A conformação física da cidade é a princípio determinada pelo curso sinuoso do rio, e a isso se deve o fato de não existirem eixos estruturantes em seu traçado. O outro fator determinante é a importância atribuída ao patrimônio histórico, no sentido de que o centro histórico se fez o centro de todas as atenções e local das maiores concentrações e fluxos de toda a cidade. Este se fez intocável e a idéia de adequar este espaço às necessidades do homem contemporâneo é simplesmente inaceitável aos cidadãos romanos e adoradores da história e da arte de todo o mundo. Mesmo durante o regime fascista os monumentos foram de tal forma respeitados, que Mussolini consolidou a sede do poder em um novo “quartiere” de forma a preservar o patrimônio da nação. Desta forma, hoje Roma é uma cidade que sofre com problemas de congestionamento de automóveis, graças à impossibilidade de se construir metrôs e alargamento de vias. A cada obra em andamento os construtores temem a possibilidade de nas escavações se encontrarem vestígios arqueológicos, atrasando assim, a entrega da edificação. Enfim, uma série de fatos se contrapõe neste principal fator determinante do crescimento físico de Roma. Enquanto todos adorariam viver ou visitar o cenário deslumbrante que constitui o maior acervo a céu aberto dos grandes gênios da história ocidental, é necessário observar o choque nas contraposições dos elementos históricos com o ritmo da vida atual de uma sociedade baseada em valores completamente distintos e necessidades cada vez mais distantes da vida “congelada” em boa parte do território de Roma.






Processo oposto sofreu a cidade de Berlim. A cidade inteiramente arrasada após a Segunda Grande Guerra Mundial e a divisão causada pelos longos anos de Guerra Fria originaram no povo germânico a vontade da superação do orgulho nacionalista. O processo de recuperação urbanística se deu de forma oposta à de Roma. Os alemães ao invés de cultuarem as ruínas e o patrimônio histórico hoje procuram esconder os vestígios da derrota e da vergonha do legado deixado pelo Nazismo. Este sentimento se reflete na paisagem da cidade, que recebeu nas antigas ruínas uma nova roupagem high tech, na reconstrução de bairros inteiros, enfim na reestruturação de espaços de convívio social humanizados e que mostram ao mundo a potência alemã capaz de renascer das cinzas e se equiparar em um curto período de tempo às grandes potências econômicas do mundo.




O processo de espalhamento urbano de Barcelona é bastante particular. A cidade iniciou-se como uma pequena vila medieval de forma pentagonal na costa Catalã. Sofreu invasões mulçumanas, que lhe atribui uma característica arquitetônica única, uma mistura de elementos góticos com mucharabis, portadas árabes, edificações que lembram mesquitas, pátios internos, enfim, uma riqueza incalculável de elementos justapostos que coexistem com primor, conformando um dos mais belos conjuntos arquitetônicos do mundo.Até que Idelfonso Cerdá propôs um novo traçado urbano adequado as transformações ocorridas na sociedade ao longo dos anos: o pequeno perímetro da cidade medieval já não comportava mais as necessidades da cidade. Propôs novos quarteirões vias de acesso à automóveis, passagens de pedestre, enfim uma nova conformação de cidade adequada ao novo homem catalão. Surge então o que hoje entendemos por urbanismo. Até hoje Barcelona mantém este traçado. O pentágono medieval é hoje patrimônio tombado e abriga galerias e acervos dos célebres artistas espanhóis.





Paris é talvez a cidade onde estes processos se espalhamento urbano e crescimento de deram de maneira mais intensa. Também surgiu nas margens do Rio Sena, o que não impediu que em determinado período de sua história a escassez de água gerasse inúmeros problemas. Paris também se caracterizou pelos engenhosos sistemas de captação de águas e sistema de escoamento de dejetos. Até que a poluição e insalubridade se tornaram tão insustentáveis, que sob as ordens de Napoleão III o Barão de Haussmann propôs à exemplo de Cerdá em Barcelona um novo traçado, mas com a diferença que lá quarteirões inteiros seriam radicalmente arrasados em nome de uma “revolução sanitarista”. Haussmann recriou a cidade de Paris destruindo a arquitetura pré-existente e impondo uma nova, seguindo o estilo eclético da moda, que até hoje é celebrado.Hoje uma política de preservação muito rigorosa é imposta na conservação do patrimônio arquitetônico da cidade. Desta forma para a sua adequação á mudança do homem moderno, fora do perímetro da Paris de Haussmann, a partir de La Defense uma nova cidade se estabelece onde arranha-céus predominam na paisagem. Procurou-se conservar a obra de arte que o conjunto eclético projetado pelo barão constitui, mas evitando cuidadosamente que o seu erro de dizimar a pré-existência em nome da adequação aos novos tempos se repetisse, fazendo que as “duas cidades” (Paris histórica e contemporânea) coexistam em harmonia.









Um exemplo bem diverso dos anteriores citados é a cidade do Rio de Janeiro. Diverso porque o processo de espalhamento urbano foi estabelecido sob um fator especial: a topografia.
Os bairros próximos do mar, situados na chamada Zona Sul, os primeiros a serem ocupados abrigam a vida da classe social mais favorecida da cidade. A media que vai-se dirigindo à Zona Norte e adentrando-se aos morros, a paisagem começa a mudar radicalmente. Vão surgindo os conjuntos monumentais conhecidos por favelas.
Bairros como Copacabana seguem um traçado ortogonal, ao estilo europeu, enquanto que nas favelas, a arquitetura do improviso vai nascendo e se expandindo de maneira completamente orgânica. Verdadeiros labirintos se constituem lembrando um pouco a conformação das cidades medievais. Cada favela possui organização, normas e realidades muito distintas e constituem o maior pedaço do Rio de Janeiro, o que impossibilita uma definição generalizada do tecido urbano da cidade. Os morros da cidade são como miragens. Eles ao mesmo tempo em que exercem um poder hipnótico de atração sob o olhar do admirador, segregam a população pobre da cidade transformando-se em verdadeiras barreiras, não apenas físicas, mas abismos que separam as pessoas e constituem diferentes Rios de Janeiro.








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